Estudos mostram que houve aumento na incidência de furação. IPCC prevê que estes fenômenos serão mais intensos nos próximos anos.

Para o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), existe um vínculo provável entre as mudanças climáticas e os furacões.

A organização prevê que estes fenômenos serão mais intensos no século XXI, embora a questão seja objeto de intenso debate entre os especialistas.

"A pesquisa científica sobre o impacto das mudanças climáticas nos furacões é um tema que continua em aberto", declarou Serge Planton, encarregado do grupo de pesquisas climáticas do serviço meteorológico francês Meteo France.

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Para ele, "a complexidade do fenômeno - um furacão depende da temperatura da superfície do mar, mas também da estrutura dos ventos em todo o volume da atmosfera - não responde de forma linear, simples, ao aquecimento global".

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Em seu último relatório sobre eventos climáticos extremos, o IPCC considera difícil assegurar que tenham aumentado a intensidade, a frequência ou a duração dos furacões nos últimos 40 anos, quando se iniciaram as observações por satélite.

No entanto, no Atlântico Norte, onde Sandy se originou, "aumentou o número de furacões, em particular os de maior envergadura", avaliou a agência nacional americana oceânica e atmosférica (NOAA).

"Quarenta anos é muito pouco tempo para tirar conclusões" relativas à possível incidência das mudanças climáticas neste aumento, avaliou Planton.

No entanto, um estudo publicado nesta terça-feira na revista Proceedings, da Academia de Ciências dos Estados Unidos (PNAS), tende a confirmar esta incidência do aquecimento global.

Após reconstituir as variações do mar no Golfo do México desde 1923, os investigadores chegaram à conclusão de que "as temporadas de ciclone dos anos quentes foram mais ativas do que as dos anos frios".

Com base em modelos, o IPCC considera "provável" que não haja mais ciclones ou que inclusive haja menos, mas que sejam mais intensos, mais chuvosos e com mais ventos.

Embora os estudos disponíveis sobre o Atlântico Norte tendam a confirmar estes prognósticos, "há uma incerteza sobre estas projeções e são necessárias outras pesquisas", afirmou a NOAA.

No entanto, para Tom Mitchell, encarregado do tema no Instituto de Desenvolvimento de Ultramar britânico, há "já muita coerência entre o que se vê no mundo e os prognósticos do IPCC sobre os eventos extremos".

Fonte:

http://ultimosegundo.ig.com.br/ciencia/2012-10-30/especialistas-discutem-possiveis-vinculos-entre-mudancas-climaticas-e-furacoes.html

 

Agência FAPESP – Nos próximos anos, em função das mudanças climáticas globais, eventos climáticos extremos, como ondas de calor, recordes de temperaturas altas e fortes precipitação de chuvas, que ocorriam em intervalos de 20 anos, devem ocorrer com maior frequência, intensidade e duração do que há cinco décadas.

Porém, o que irá determinar o risco de desastres, que acarretam a perda de vidas humanas e prejuízos econômicos, como os causados por deslizamentos de terra desencadeados pelas fortes chuvas que assolaram o Rio de Janeiro no início de 2011, será o nível de vulnerabilidade e de exposição das populações a esses eventos climáticos extremos.

As conclusões são do Relatório Especial sobre Gestão dos Riscos de Eventos Climáticos e Desastres (SREX, na sigla em inglês), elaborado e recentemente publicado pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).

Os resultados das avaliações feitas pelo IPCC no documento foram discutidos no dia 16 de agosto durante o workshop “Gestão dos riscos dos extremos climáticos e desastres na América Central e na América do Sul – O que podemos aprender com o Relatório Especial do IPCC sobre extremos?”.

Realizado pela FAPESP e pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em parceria com o IPCC, o Overseas Development Institute (ODI) e a Climate and Development Knowledge Development (CKDN), ambos do Reino Unido, e apoio da Agência de Clima e Poluição e do Ministério de Relações Exteriores da Noruega, o objetivo do evento foi debater as conclusões do SREX e as opções para o gerenciamento dos impactos dos extremos climáticos, especialmente nas Américas do Sul e Central.

Um dos principais apontamentos do relatório, elaborado pelo IPCC à pedido do governo da Noruega e da Estratégia Internacional para a Redução de Desastres (EIRD) da Organização das Nações Unidas (ONU), é que os impactos dos eventos climáticos extremos dependem não só da natureza, mas do nível de vulnerabilidade e da exposição das pessoas ou grupos humanos em lugares onde possam ser afetados.

“Os desastres não são ‘naturais’, mas são conjunções de eventos climáticos ou meteorológicos naturais com a vulnerabilidade e a exposição a eles por uma sociedade ou grupo humano”, disse Vicente Barros, pesquisador do Centro de Investigacíon del Mar y la Atmósfera (Cima) da Universidad de Buenos Aires, na Argentina, e co-presidente do Grupo de Trabalho II do SREX.

“Se o problema dos riscos climáticos é um conjunção destes três fatores, evidentemente, é preciso desenvolver estratégias para mitigá-los”, avaliou Barros. Umas das principais ações destacadas no relatório para diminuir os riscos de eventos climáticos é reduzir as emissões dos gases de efeito estufa, que são a principal causa das mudanças climáticas.

Já para reduzir o nível de exposição das populações aos eventos climáticos extremos, os cientistas afirmam que é preciso aprimorar os sistemas de alertas e, em alguns casos, realocar as pessoas.

Por sua vez, para atenuar a vulnerabilidade humana aos riscos de desastres causados pelas mudanças do clima, o documento indica que é preciso implementar políticas de diminuição de pobreza e melhorar o nível educacional das populações para aumentar o grau de conscientização das pessoas sobre os riscos dos eventos climáticos extremos.

De acordo com dados do relatório, 95% dos desastres causados por eventos climáticos extremos no período de 1970 a 2008 ocorreram em países em desenvolvimento e apenas 5% em países desenvolvidos.

“Uma mensagem muito importante do relatório é que a maneira mais efetiva para aumentar a resistência das populações aos eventos climáticos extremos é melhorar as condições de desenvolvimento socioeconômico”, afirmou Sebástian Vicuña, professor da Pontificia Universidad Católica de Chile.

Necessidade de mais estudos sobre o Brasil

Composto por nove capítulos e quatro anexos, o SREX foi preparado ao longo de dois anos por 220 autores de 62 países, reunidos em dois grupos de trabalho do próprio IPCC: o Grupo I, que avalia a base física das mudanças climáticas, e o Grupo II, que trata dos impactos das alterações climáticas, adaptações e vulnerabilidades.

Os autores do documento responderam a mais de 20 mil comentários de representantes de governos, especialistas e agências internacionais, com aprovação do Sumário para Formuladores de Políticas, após reunirem-se por quatro dias em Kampala, na Uganda, em novembro.

Uma das deficiências identificadas pelos cientistas na elaboração do relatório foi a necessidade de realização de mais pesquisas sobre extremos climáticos relacionados às regiões do Brasil.

“Detectamos uma ausência de estudos, publicados em revistas indexadas, sobre extremos climáticos nas regiões do Brasil”, disse José Marengo, pesquisador do Centro de Ciência do Sistema Terrestre do Inpe e membro do comitê organizador do evento.

“Só agora a Amazônia começou a aparecer nos estudos sobre os extremos climáticos, e ainda há poucos artigos científicos sobre outras regiões do país com o nordeste”, disse Marengo.

De acordo com o pesquisador, as análises sobre o Nordeste no relatório foram baseadas em artigos publicados em revistas científicas brasileiras da área, como a Revista Brasileira de Meteorologia e a Revista Brasileira de Agrometeorologia, que estão indexadas no SciELO (Bireme/FAPESP), o que representou uma conquista dos cientistas brasileiros no IPCC.

“Conseguimos, pela primeira vez, fazer referências de artigos publicados em revistas científicas brasileiras, que são indexadas e têm um comitê de revisores, em um relatório do IPCC”, disse Marengo.

“Isso representou a quebra de um tabu do IPCC, que só fazia referência a artigos científicos publicadas em revistas em inglês. Mas é preciso desenvolver mais estudos sobre eventos climáticos extremos em regiões brasileiras”, disse.

Outra área carente de pesquisas que os autores do relatório identificaram foi sobre estudos sobre os aspectos socioeconômicos dos impactos das mudanças climáticas. “Há muitos dados sobre a base física das mudanças climáticas, mas estão faltando mais estudos socioeconômicos em nível global”, apontou Barros.

De acordo com o pesquisador, a maioria dos estudos sobre os impactos socioeconômicos dos eventos extremos causados pelas mudanças climáticas globais são publicados por instituições internacionais, como Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e o Banco Mundial. Entretanto, apesar dessas informações serem consideradas importantes e valiosas, elas não passam pelo crivo científico. Por isso, não são utilizadas nos relatórios do IPCC.

Segundo Marengo, um dos pontos mais importantes do SREX, que é o mais novo relatório do IPCC, é que ele fornece informações mais atualizadas e analisa a questão dos extremos climáticos com maior nível de detalhe.

Entretanto, ainda apresenta limitações em termos de cobertura de dados e sobre os modelos utilizados para prever as mudanças climáticas globais, que devem ser mais clarificados no quinto relatório do IPCC, que está previsto para ser publicado em 2013.

“Muitas das informações publicadas no SREX serão atualizadas no quinto relatório do IPCC, por meio do qual esperamos ter uma melhor compreensão dos eventos climáticos extremos”, disse Marengo.

Contribuição de programa da FAPESP

Na avaliação de Carlos Nobre, secretário de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e membro da coordenação do Programa FAPESP de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG), a publicação do quarto relatório do IPCC, em 2007, fez com que a discussão sobre os impactos das mudanças climáticas globais ganhasse uma grande popularidade no mundo.

Mas, segundo Nobre, em 2005 a diretoria científica da FAPESP já discutia sobre a necessidade de criar um programa de pesquisa voltado para o tema. “A diretoria científica da FAPESP teve uma visão estratégica e pioneira em criar o PFPMCG. A partir do programa, o governo federal também formulou uma série de programas voltados à área – em especial a Rede Brasileira sobre Mudanças Climáticas e Clima –, que interage estritamente com o PFPMCG”, contou.

O diretor científico da FAPESP, Carlos Henrique de Brito Cruz, destacou no workshop que quando se começou a discutir sobre a criação do PFPMCG um dos objetivos definidos para o programa de pesquisa era estimular pesquisas sobres mudanças climáticas por pesquisadores do Estado de São Paulo e, por meio disso, fazer com que o Brasil viesse a ter uma posição de maior destaque e protagonismo no debate mundial sobre mudanças climáticas globais.

“Esse evento e outros do gênero realizados nos últimos anos mostram que a expectativa do programa está se cumprindo, com base no fato de haver uma articulação para o incentivo à pesquisa científica e tecnológica em temas relacionados às mudanças climáticas globais”, disse Brito Cruz.

Celso Lafer, presidente da FAPESP, destacou o papel que o IPCC tem exercido na formulação de políticas globais para mitigar os impactos das mudanças climáticas globais.

“O IPCC é uma plataforma de conhecimento que foi decisiva para que se assinasse na RIO92 a Convenção de Clima. Dou meu testemunho como ministro das Relações Exteriores naquela ocasião e justamente porque tenho acompanhado no campo diplomático essas negociações”, disse.

“É minha profunda convicção de que as negociações climáticas só poderão ser apropriadamente encaminhadas se tiverem o lastro do conhecimento de qualidade, como o fornecido pelo IPCC”, disse Lafer.

Por Elton Alisson

Pesquisadores de países latino-americanos – incluindo o Brasil – e europeus publicaram um artigo na revista Global Change Biology no qual dão uma série de recomendações para o desenvolvimento de uma agenda científica e política sobre os impactos das mudanças ambientais e climáticas globais e regionais em ecossistemas costeiros marinhos na América Latina.


De acordo com os autores, na região há uma grande variedade de habitats bentônicos (formados por organismos que vivem nos substratos marinhos), muitos dos quais com grande biodiversidade e prioritários para ações de conservação (hotspots). Entre eles, há enormes camadas de rodolitos (recifes de algas calcárias), além de manguezais, bancos de gramíneas marinhas e recifes de coral no oceano Atlântico Tropical com um grande número de espécies endêmicas (próprias).

Esses habitats marinhos são extremamente importantes para os moradores de áreas costeiras da América Latina, que dependem da qualidade ambiental marinha para o desenvolvimento de atividades econômicas como a pesca e o turismo.

Segundo os autores do estudo, é preciso protegê-los, principalmente em um momento de rápidas mudanças ambientais e climáticas e ante problemas sociais, como a urbanização descontrolada na região, que se somam a pressões como poluição aquática, sobrepesca e perda ou fragmentação de habitats.

“Há vários grupos que estudam os impactos das mudanças climáticas, em especial no Brasil. Mas isso não ocorre na mesma escala em outros países das Américas do Sul e Central”, disse Alexander Turra, professor do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (USP) e primeiro autor do artigo, à Agência FAPESP.

Turra coordena atualmente a Rede de Monitoramento de Habitats Bentônicos Costeiros (ReBentos), apoiada pela FAPESP no âmbito de um acordo com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) para consolidação do Sistema Nacional de Pesquisa em Biodiversidade (Sisbiota).

Vinculada à Sub-Rede Zonas Costeiras da Rede Clima (MCT) e do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Mudanças Climáticas (INCT-MC), o objetivo do projeto, lançado no início de 2011, é instituir uma rede integrada de estudos dos habitats bentônicos do litoral brasileiro a fim de detectar efeitos das mudanças ambientais regionais e globais sobre esses organismos e iniciar uma série histórica de dados sobre a biodiversidade bentônica na costa brasileira.

“A ideia é estabelecer sítios de monitoramento ao longo da costa brasileira, a serem observados durante muito tempo”, explicou Turra. A rede reúne 120 bentólogos de 14 estados brasileiros, voltados ao estudo dos impactos das mudanças ambientais e climáticas em habitats costeiros marinhos.

Na avaliação de Turra e de outros autores do artigo, a ReBentos e outras redes similares na América Latina, como o Grupo Sul-Americano de Pesquisa de Ecossistemas Costeiros (Sarce), representam iniciativas de monitoramento contínuo de habitats de ecossistemas costeiros marinhos que devem ser replicadas em outros países da região, para preencher lacunas críticas no conhecimento sobre o impacto das mudanças climáticas.

“A aplicação sistemática de protocolos padronizados de monitoramento, adaptados para cada habitat, escala, nível de organização e diferentes condições oceanográficas é essencial para documentar a degradação, fragmentação ou perda de habitats costeiros marinhos”, destacam os autores no artigo.

“É preciso espalhar essas ações experimentadas e testadas a outros países da região por meio de projetos locais já em curso e construir uma base de dados com acesso aberto a informações sobre o estado atual e previsões de mudanças em habitats em níveis local, regional e global”, indicam.

Áreas prioritárias de ação

Segundo os autores do estudo, os esforços iniciais de monitoramento de habitats costeiros devem ser centrados em locais que já sofrem pressões prejudiciais imediatas, como os recifes de coral do Caribe nos quais se registra o branqueamento (morte dos pólipos responsáveis pela formação do recife), associado ao aquecimento dos oceanos.

Já a acidificação (diminuição do pH e aumento da acidez) dos oceanos não só ameaça degradar as maiores camadas de rodolitos do mundo, existentes na costa brasileira, mas pode reduzir a capacidade de organismos marinhos, como crustáceos, mexilhões e ostras, de produzirem conchas – colocando em risco a aquicultura e a segurança alimentar de comunidades ribeirinhas, salientam os autores.

Os pesquisadores fazem a ressalva, no entanto, de que são necessários estudos para comprovar a associação desses problemas ambientais às mudanças climáticas.

“Discutimos essas questões teoricamente, porque ainda não temos muita base do diagnóstico inicial – o chamado baseline – dos ecossistemas marinhos para entender como eles eram e constatar as mudanças pelas quais passam. Por isso, precisamos acompanhar esses organismos por muito tempo”, disse Turra.

Outra preocupação dos especialistas é o impacto de eventos climáticos extremos – que tendem a ser mais frequentes com as mudanças climáticas globais – sobre ecossistemas marinhos (como manguezais) com papéis importantes na proteção da linha de costa, sujeitas ao regime de marés e à energia das ondas.

Os pesquisadores chamam a atenção para a necessidade de um sistema de alerta a eventos climáticos extremos em comunidades costeiras – mais expostas às intempéries da natureza.

“O aumento da frequencia e da magnitude de tempestades associado com a elevação da energia das ondas do mar pode comprometer a linha de costa e causar impactos em edificações e construções. Um exemplo disso, embora não comprovadamente associado às mudanças climáticas, foram os impactos sofridos pelo Porto de Itajaí, em Santa Catarina, em 2008”, exemplificou Turra.

Contribuição para o AR5

O artigo publicado na Global Change Biology é resultado do workshop “Evaluating the sensitivity of Central and South American benthic communities to global environmental change”, realizado no fim de abril de 2012, em Ilhabela, no litoral de São Paulo, sobre como os países das Américas Latina e Central devem se preparar para as mudanças ambientais globais.

Organizado por Flávio Berchez, professor do Departamento de Botânica do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP), membro da ReBentos e um dos autores do artigo, por Turra e outros pesquisadores, o workshop reuniu cientistas de dez países latino-americanos e de três países europeus.

“Estudiosos dos ecossistemas marinhos apontam a falta de pesquisas na América Latina com abordagens importantes, como as destacadas no artigo, para se chegar a conclusões sobre os impactos das mudanças climáticas nos ecossistemas, como outros países já fazem”, contou Marcos Silveira Buckeridge, professor do Departamento de Botânica do Instituto de Biociências da USP. “Por conta disso, sugeri o workshop e que o evento resultasse em um artigo reunindo essas informações para reportá-las ao IPCC.”

Buckeridge é um dos relatores do capítulo 27 do próximo relatório do Painel Intergovernamental de Ciências Climáticas (IPCC) – o AR5 –, previsto para ser publicado em 2014. O capítulo trata dos efeitos das mudanças climáticas nas Américas Latina e Central.

De acordo com Buckeridge, o artigo será submetido à avaliação dos relatores do capítulo 27 do AR5 na próxima reunião do grupo de cientistas, em julho na Eslovênia.

O artigo Global environmetnal changes: setting priorities for Latin American coastal habitats (doi: 10.1111/ gcb.12186), de Alexander Turra e outros, pode ser lido em onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/gcb.12186/abstract.

A região da Terra onde actualmente as mudanças ambientais são mais profundas e extensas é o Árctico, localizado a norte do Círculo Polar Árctico.

Cerca de 62% do Árctico é oceano, em grande parte coberto por gelo. A extensão de gelo oscila com as estações do ano entre um máximo e um mínimo, mas a área média está a diminuir aceleradamente desde o início da sua monitorização na década de 1950.

A partir de 1979, quando as observações começaram a ser feitas por satélite, a área mínima de gelo decresceu em média 8% por década, o que corresponde a uma média anual de 57.000 quilómetros quadrados. Em Setembro de 2012, a área de gelo oceânico atingiu um mínimo absoluto de 3,4 milhões de quilómetros quadrados, 18% menos do que o anterior recorde de 2007 e 49% menos do que o mínimo de 1979.

O volume do gelo oceânico diminui ainda mais rapidamente do que a área. De acordo com estudos realizados no Polar Science Center da Universidade de Washington, em Setembro de 2012, o volume era 3400 quilómetros cúbicos, ou seja, 80% menor do que em 1979.

É provável que na década de 2030 o Árctico fique livre de gelo oceânico, situação que se considera corresponder a uma área de gelo menor do que um milhão de quilómetros quadrados, a maior parte junto das costas do Canadá e Gronelândia.

Mas a mudança ambiental não se confina ao oceano Árctico. Os glaciares estão a retroceder e os campos de gelo que cobrem a Gronelândia sofrem uma perda anual de massa de cerca de 200 milhares de milhões de toneladas, quantidade suficiente para satisfazer o consumo anual de água de mais de dois milhões de pessoas.

No que respeita à temperatura, a sua média anual no Árctico aumentou cerca de 1,5ºC desde meados do século XX, aproximadamente o dobro do aumento da temperatura média global. No topo dos campos de gelo da Gronelândia, a cerca de 2000 metros de altitude, a paisagem está a modificar-se de forma rápida e surpreendente.

A anterior imensidão branca está agora semeada de lagos, ribeiras e rios de cor azul, castanha e negra devido à presença da crioconite, constituída por poeiras dos desertos e fuligem, uma forma de carbono impuro proveniente das centrais térmicas a carvão, da combustão do petróleo e seus derivados, dos fogos florestais e de outras fontes antropogénicas.

Devido à sua cor escura, a crioconite absorve a radiação solar, aquece e funde o gelo onde se deposita criando buracos cheios de água líquida que se transformam em lagos. Esta água acaba por se infiltrar em condutas verticais até atingir a base da camada de gelo, acelerando o processo de fusão. A área onde o gelo se funde superficialmente no Verão tem estado a aumentar e atingiu um máximo de 97% no mês de Julho de 2012. Foi também em 2012 que se observaram alguns dos maiores icebergues a desprenderem-se dos glaciares da Gronelândia.

As transformações ambientais aceleradas no Árctico têm algumas consequências económicas positivas imediatas para os cinco países que o partilham – Rússia, EUA, Canadá, Dinamarca (Gronelândia) e Noruega. O degelo oceânico está a tornar possível a navegação comercial através do Árctico ao longo da costa da Sibéria, diminuindo a distância entre a Europa Ocidental e o Extremo Oriente em cerca de um terço.

Esta passagem, designada na Rússia por Rota Marítima do Norte, está a ser progressivamente utilizada para transporte de mercadorias, tendo sido utilizada por 34 navios comerciais em 2011 e 46 em 2012. A China, Japão e Coreia do Sul estão a investir fortemente na construção de navios adaptados às condições árcticas.

De acordo com um estudo do US Geological Survey de 2008, o Árctico contém 13% do total das reservas mundiais estimadas de petróleo e 30% de gás natural. Com o degelo, a exploração destas imensas reservas torna-se menos difícil. Em 12 de Abril de 2012, Vladimir Putin anunciou um novo conjunto de incentivos para atrair o investimento necessário à exploração do petróleo e do gás natural no Árctico e afirmou que “os campos offshore, especialmente no Árctico, são sem exagero a reserva estratégica [russa] para o século XXI”.

Passados quatro dias, a ExxonMobil e a empresa russa Rosneft assinaram um contrato para investir até 500 mil milhões de dólares na exploração de petróleo no mar de Kara, no Árctico, e no mar Negro. EUA, Canadá, Noruega e Gronelândia estão também a investir na exploração de petróleo e gás natural no Árctico.

Com o aumento da temperatura no Árctico, o modo de vida das populações indígenas está a ser alterado, os ecossistemas estão a migrar para norte e algumas espécies poderão vir a desaparecer. A tundra e as florestas recuam para latitudes mais elevadas, tornando apropriadas para a agricultura vastas regiões. Desde a década de 1980, cerca de 20% da área de tundra tem agora florestas boreais.

Peixes com valor económico, tais como bacalhau, hadoque e verdinho, estão a deslocar-se para as águas do Árctico. A produção agrícola está a aumentar na Gronelândia e o seu potencial de geração de hidroelectricidade, o maior do mundo, começa a ser mais fácil de explorar. Sabe-se que o Árctico é rico em ferro, zinco, ouro, níquel, urânio, terras raras, diamantes e rubis, e, dada a crescente escassez de algumas destas matérias-primas, há várias minas que vão começar a ser exploradas brevemente. As expectativas de crescimento económico que resultam de condições ambientais menos rigorosas estão a alimentar o desejo de independência das 57.000 pessoas que vivem na Gronelândia.

Mas afinal qual a razão de mudanças ambientais tão profundas e intensas no Árctico? Para as cerca de quatro milhões de pessoas que vivem no Árctico, é evidente que o clima está a mudar. Mas no contexto do actual paradigma de desenvolvimento, a pergunta é quase irrelevante para muitos dos que beneficiam do crescimento económico que essas mudanças potenciam. As companhias petrolíferas têm relutância em admitir que os efeitos das alterações climáticas estejam a incentivar o seu interesse crescente pela exploração do Árctico. Por outras palavras, evitam reconhecer que o seu negócio está em grande parte na origem das novas oportunidades que estão a surgir no Árctico, o que constitui um perigoso círculo vicioso.

Porquê alterações climáticas tão intensas no Árctico? A razão está, principalmente, num poderoso mecanismo de retroacção positiva (que se poderá designar também por círculo vicioso) em que a fusão de gelo oceânico e a sua substituição por água no estado líquido diminui a reflexão da radiação solar, o que contribui para o aquecimento da atmosfera.

Quais as consequências no resto do mundo das mudanças ambientais no Árctico? A fusão completa dos campos de gelo da Gronelândia causaria uma subida do nível médio do mar de cerca de sete metros e a deslocação de milhares de milhões de pessoas das zonas costeiras de todo o mundo. Cidades como Lisboa, Londres, Nova Iorque, Miami, Bombaim, Guangzhou, Alexandria, entre muitas outras, ficariam parcialmente ou totalmente inundadas, se não se construíssem protecções muito dispendiosas. Calcula-se que o processo de fusão integral torna-se irreversível para aumentos da temperatura média global superiores a 3ºC, embora seja muito lento, levando muitas centenas de anos.

O aquecimento do Árctico provoca ainda a libertação do metano contido no permafrost e nos hidratos de metano da plataforma continental. Estas emissões têm um efeito de retroacção positiva intensificando o aquecimento. Em termos económicos, os benefícios que as alterações climáticas trazem para a exploração do Árctico não compensam de modo algum os prejuízos de longo prazo dos seus impactos negativos à escala global. Estamos perante mais um exemplo de desenvolvimento insustentável que nos adverte para um futuro difícil.

Autor: Filipe Duarte Santos, professor catedrático da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.